O sino de ouro – interpretação 8/9º ano

Rubem Braga é um dos maiores cronistas brasileiros.  Trabalhar com crônicas em sala de aula é bem interessante. É interessante falar um pouco sobre crônicas ou sobre o autor antes de trabalhar o texto.Se alguém tiver dúvida em alguma questão ou precisar do gabarito, é só pedir, mas deixe o email para contato para que eu possa enviá-lo.

O sino de ouro
Rubem Braga
Contaram-me
que, no fundo do sertão de Goiás, numa localidade de cujo nome não estou certo,
mas acho que é Porangatu, que fica perto do rio de Ouro e da serra de Santa
Luzia, ao sul da Serra Azul – mas também pode ser Uruaçu, junto do rio das
almas e da serra do Passa Três (minha memória é traiçoeira e fraca; eu esqueço
os nomes das vilas e a fisionomia dos irmãos, esqueço os mandamentos e as
cartas e até a amada que amei com paixão) -, mas me contaram que em Goiás,
nessa povoação de poucas almas, as casas são pobres e os homens pobres, e
muitos são parados e doentes indolentes, e mesmo a igreja é pequena, me
contaram que ali tem – coisa bela e espantosa – um grande sino de ouro.

            Lembrança de antigo esplendor,
gesto de gratidão, dádiva ao Senhor de um grã-senhor – nem Chartres, nem
colônia, nem S. Pedro ou Ruão, nenhuma catedral imensa com seus enormes
carrilhões tem nada capaz de um som tão lindo e puro como esse sino de ouro, de
ouro catado e fundido na própria terra goiana nos tempos de antigamente.É
apenas um sino, mas é de ouro. De tarde seu som vai voando em ondas mansas sobre
as matas e os cerrados, e as veredas de buritis, e a melancolia do chapadão, e
chega ao distante e deserto carrascal, e avança em ondas mansas sobre os campos
imensos, o som do sino de ouro. E a cada um daqueles homens pobres ele dá cada
dia sua ração de alegria. Eles sabem que de todos os ruídos e sons que fogem do
mundo em procura de Deus – gemidos, gritos, blasfêmias, batuques, sinos,
orações, e o murmúrio temeroso e agônico das grandes cidades que esperam a
explosão atômica e no seu próprio ventre negro parecem conter o germe de todas
as explosões – eles sabem que Deus, com especial delícia e alegria, ouve o som
alegre do sino de ouro perdido no fundo do sertão. E então é como se cada
homem, o mais mesquinho e triste, tivesse dentro da alma um pequeno sino de
ouro.
            Quando vem o forasteiro de
olhar aceso de ambição, e propõe negócios, fala em estradas, bancos, dinheiro,
obras, progresso, corrupção – dizem que esses goianos olham o forasteiro com um
olhar lento e indefinível sorriso e guardam um modesto silêncio. O forasteiro
de voz alta e fácil não compreende; fica, diante daquele silêncio, sem saber
que o goiano está quieto, ouvindo bater dentro de si, com um som de extrema
pureza e alegria, seu particular sino de ouro. E o forasteiro parte, e a povoação
continua pequena, humilde e mansa, mas louvando a Deus com sino de ouro. Ouro
que não serve para perverter, nem o homem nem a mulher, mas para louvar a Deus.

             E se Deus não existe, não faz mal.
O ouro do sino de ouro é neste mundo o único ouro de alma pura, o ouro no ar, o
ouro da alegria. Não sei se isso acontece em Porangatu, Uruaçu ou outra cidade
do sertão. Mas quem me contou foi um homem velho que esteve lá; contou dizendo:
“eles têm um sino de ouro e acham que vivem disso, não se importam com
mais nada, nem querem mais trabalhar; fazem apenas o essencial para comer e
continuar a viver, pois acham maravilhoso ter um sino de ouro”.
             O homem velho me contou isso com
espanto e desprezo. Mas eu contei a uma criança e nos seus olhos se lia seu
pensamento: que a coisa mais bonita do mundo deve ser ouvir um sino de ouro.
Com certeza é esta mesmo a opinião de Deus, pois ainda que Deus não exista, ele
só pode ter a mesma opinião de uma criança. Pois cada um de nós quando criança
tem dentro seu sino de ouro que depois, por nossa culpa e miséria e pecado e
corrupção, vai virando ferro e chumbo, vai virando pedra e terra, e lama e
podridão.
In Braga,
Rubem
. COLEÇÃO MELHORES CRÔNICAS

Seleção e
prefácio: Carlos Ribeiro
.São
Paulo: Editora Global, 2013
.

Após ler o
texto, responda:
1.Segundo o
narrador, essa história que ele conta é baseada em:
(    )  uma história ouvida de um velho que esteve lá.
(    ) um relato
feito por um  forasteiro  que visitou a cidade e quis negociar o sino de ouro.
(    ) o que lhe contou um morador da cidade do
sino de ouro.
2. Observe o
trecho “ […] numa localidade de cujo nome não estou certo ,
mas acho que é Porangatu […] mas também pode ser
Uruaçu […]”
 Por que a precisão geográfica parece não importar
ao narrador?

3.Como são os
moradores e a povoação cuja igreja tem um sino de ouro?

4. Como os moradores
olham o forasteiro ambicioso que chega a sua cidade?

5. O que
representa o ouro para:
a)
o forasteiro?
b)
os moradores do povoado?
6.Em
relação à história do sino de ouro, que atitude tem:
a)
o homem velho que contou a história?
b)
a criança que ouviu a história contada pelo narrador?
7.
O narrador termina a história afirmando que cada um nós
quando criança tem dentro seu sino de ouro que depois
se degrada. O que simboliza esse sino?
8.
Segundo o cronista, o que faz mudar o modo como vemos as coisas?

9. A frase “E a cada um daqueles
homens pobres ele dá cada dia sua ração de alegria.” Mostra que as pessoas
daquele povoado:
 (   )
São exibidas pois só elas têm um sino de ouro.
(   ) Entendem que a maior riqueza não está no
ouro do sino, mas no ouro do coração.
(   ) Veem o ouro do sino e se lembram o quanto
são pobres.
(   ) Esquecem-se dos gemidos do mundo, assim
como a explosão da bomba atômica que mora dentro deles.

10. Identifique que figuras de linguagem ocorrem no trecho “Pois cada um de nós quando criança tem
dentro de sua alma seu sino de ouro que, depois, por nossa culpa e miséria e
pecado e corrupção, vai virando ferro e chumbo, vai virando pedra e terra, e
lama, e podridão.” 

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