CONTO – Interpretação 7º/8º ano TENTAÇÃO – Clarice Lispector

Esse conto de Clarice Lispector é muito interessante
para análise e interpretação, Nessa atividade, a sugestão é mais a interpretação
mas pode-se aproveitar para trabalhar o foco narrativo, os elementos e a  estrutura da narrativa. Após o texto há questões para interpretação, o gabarito e sugestão para debate.

TENTAÇÃO
   Ela estava com soluço. E como se não
bastasse a claridade das duas horas, ela era ruiva.
   Na rua vazia as pedras vibravam de
calor – a cabeça da menina flamejava. Sentada nos degraus de sua casa, ela
suportava. Ninguém na rua, só uma pessoa esperando inutilmente no ponto do
bonde. E como se não bastasse seu olhar submisso e paciente, o soluço a
interrompia de momento a momento, abalando o queixo que se apoiava conformado
na mão. Que fazer de uma menina ruiva com soluço? Olhamo-nos sem palavras,
desalento contra desalento. Na rua deserta nenhum sinal de bonde. Numa terra de
morenos, ser ruivo era uma revolta involuntária. Que importava se num dia
futuro sua marca ia fazê-la erguer insolente uma cabeça de mulher? Por enquanto
ela estava sentada num degrau faiscante da porta, às duas horas. O que a
salvava era uma bolsa velha de senhora, com alça partida. Segurava-a com um
amor conjugal já habituado, apertando-a contra os joelhos.
   Foi quando se aproximou a sua outra metade
neste mundo, um irmão em Grajaú. A possibilidade de comunicação surgiu no
ângulo quente da esquina, acompanhando uma senhora, e encarnada na figura de um
cão. Era um basset lindo e miserável, doce sob a sua fatalidade. Era um basset
ruivo.
   Lá vinha ele trotando, à frente de sua dona, arrastando seu
comprimento. Desprevenido, acostumado, cachorro.
   A menina abriu os olhos pasmada. Suavemente avisado, o cachorro
estacou diante dela. Sua língua vibrava. Ambos se olhavam.

 Entre tantos seres que estão prontos para se
tornarem donos de outro ser, lá estava a menina que viera ao mundo para ter
aquele cachorro. Ele fremia suavemente, sem latir. Ela olhava-o sob os cabelos,
fascinada, séria. Quanto tempo se passava? Um grande soluço sacudiu-a
desafinado. Ele nem sequer tremeu. Também ela passou por cima do soluço e
continuou a fitá-lo.
   Os pêlos de ambos eram curtos, vermelhos.
   Que foi
que se disseram? Não se sabe. Sabe-se apenas que se comunicaram rapidamente,
pois não havia tempo. Sabe-se também que sem falar eles se pediam. Pediam-se
com urgência, com encabulamento, surpreendidos.
   No meio de tanta vaga impossibilidade e de tanto sol, ali
estava a solução para a criança vermelha. E no meio de tantas ruas a serem
trotadas, de tantos cães maiores, de tantos esgotos secos – lá estava uma
menina, como se fora carne de sua ruiva carne. Eles se fitavam profundos,
entregues, ausentes de Grajaú. Mais um instante e o suspenso sonho se
quebraria, cedendo talvez à gravidade com que se pediam.
   Mas ambos eram comprometidos.
   Ela com sua infância impossível, o centro da
inocência que só se abriria quando ela fosse uma mulher. Ele, com sua natureza
aprisionada.
   A dona esperava impaciente sob o guarda-sol.
O basset ruivo afinal despregou-se da menina e saiu sonâmbulo. Ela ficou
espantada, com o acontecimento nas mãos, numa mudez que nem pai nem mãe
compreenderiam. Acompanhou-o com olhos pretos que mal acreditavam, debruçada
sobre a bolsa e os joelhos, até vê-la dobrar a outra esquina.

   Mas ele foi mais forte que ela. Nem uma só vez olhou para trás
__________________
Conto extraído de LISPECTOR, Clarice. Felicidade clandestina.
Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1981.
Após ler o texto, responda:

1 Quem são
as personagens principais? O que elas têm em comum?

2. O que a
menina fazia sentada na porta
de
casa, às duas horas da tarde
?

3. Onde se
passa a história? Retire do texto uma frase que apresenta uma característica
marcante do cenário.

4.De acordo
com o texto, como a menina se sentia em relação a outras pessoas? Retire do
texto uma frase para justificar sua resposta.

5. “Sentada
nos degraus de sua casa, ela suportava.” O que a menina suportava?

Indique a
alternativa que melhor responde a questão:

(a) a pessoa
que esperava o bonde   (b)  a
bolsa velha        (c) o calor e a
solidão              (d) sua mãe

6. “O que a
salvava era uma bolsa velha de senhora, com alça partida.” Do que a bolsa a salvava?

(a) do calor
excessivo                               (b) da solidão, já que a bolsa era sua
companhia

(c) das
brigas com a mãe                         (d)  do
homem que esperava o bonde

7) No texto,
quem é o narrador?

( a ) a
mãe                                                                                 (c) alguém que não presente na história

(b ) alguém
presente na história, mas sem participar muito      (d) a menina ruiva

8) Retire  do texto um trecho em que se percebe a
presença do narrador como personagem.

9) O que o narrador fazia naquele lugar ?

10)Pode-se dizer que o narrador se identifica com a menina? Por quê?

11) O cão
basset provoca uma mudança na cena inicial. Qual a reação da menina e do cão
quando se veem ?

12) “Mas
ambos eram comprometidos.” Segundo o texto, com o que eles eram comprometidos ?
O que isso pode significar?

13) Por que
o cachorro não olhou para trás?

14)
Considerando a reação da menina e do cão quando se encontram e a resposta à
questão 12, o que o título TENTAÇÃO pode indicar?

15) Qual é o
tema central do texto?

Questões
para debater:

No texto, a
menina se sente diferente dos outros, o que intensifica a solidão dela. Ser
diferente dos demais gera solidão? Você já se sentiu excluído ou sozinho por
ser diferente dos outros? Qual é sua opinião sobre isso?

RESPOSTAS:
1.    A menina e o basset.
Ambos são ruivos.
2.    Resposta pessoal – Ela
olhava o movimento…tomava sol… esperava passar o soluço etc.
3.    No bairro Grajaú, Rio
de Janeiro. “ Na rua vazia as pedras vibravam de calor”
4.    Se sentia diferente,
discriminada, provavelmente porque era ruiva. “Numa terra de morenos, ser ruivo
era uma revolta involuntária.”
5.    Resposta C
6.    Resposta B
7.    Resposta B
8.    “Olhamo-nos sem
palavras…”
9.    Provavelmente espera
o bonde. Em certo trecho ele diz ele diz “Na rua deserta nenhum sinal de bonde.”
10.  Sim. Resposta
pessoal. Talvez o narrador  se sentisse
assim porque o calor era insuportável e o bonde não vinha logo; vendo a menina
ruiva “numa terra de morenos”, sozinha, sem nada de interessante para fazer,
naquele calor insuportável.
11.  Resposta pessoal.
Sugestão: Se identificaram um com o outro: ambos eram ruivos e solitários,
poderia nascer daí uma grande amizade.
12.  Ela estava
comprometida com sua infância e o cão, com sua natureza aprisionada. Isso
significa que eles não podem ficar juntos,  pois têm naturezas diferentes, não podem fazer
companhia um ao outro.

13. Ele deveria seguir sua dona, não tinha outra escolha.
14.  Pode se referir ao
impulso de ficarem juntos ( a menina ruiva e o basset ruivo), uma tentação de
se pertencerem.


15.  O tema central é a
solidão.

Este post tem 12 comentários

  1. Anônimo

    qual éo tema central do texto ???

  2. Unknown

    Bom dia!Fátima. Gostei das atividades.
    Muito Obrigada.Bom Final de semana.Ana

  3. Anônimo

    Cade as respostas?

  4. Anônimo

    Parabéns!!!

  5. Anônimo

    ótimo trabalho!!!Parabéns… genial.

  6. Anônimo

    MUITO OTIMO ME AJUDOU MUITO

  7. Anônimo

    Olá Fátima estas questões sobre o texto são de sua autoria? Podem ser utilizadas em sala de aula como avaliação?

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